Foi assim: eu
estava esperando um telefonema, e o telefonema não vinha, e eu ia
ficando cada vez mais aflita. Era uma resposta que eu estava esperando,
uma resposta do tipo sim ou não. Não era nada que causaria um, digamos,
impacto incomensurável em toda a minha existência, mas certamente era
algo que causava um impacto naquele meu dia e talvez num bom punhado de
dias seguintes, e era algo que, com certeza, causava em mim enorme
aflição.
Lendo o jornal desorganizado à minha frente e tomando xícaras e
xícaras de chá, eu tentava compensar o telefonema que não vinha. Estava
num café, celular na mesa, controlado por meus olhos como se pudesse
fugir a qualquer instante. Às vezes, eu levantava os olhos do jornal e
observava as pessoas à minha frente, cada uma com suas próprias xícaras e
aflições. E então acabei pensando naquela que talvez seja a maior
aflição de todas.
Geralmente, quando alguém está esperando uma resposta importante – se
a promoção vai vir ou não, se foi aprovado ou reprovado no exame, se é
sim ou não, um ou dez, amanhã ou só mês que vem… Se alguém está
esperando uma resposta importante, geralmente a pessoa diz que quer
saber logo a resposta. Melhor se a resposta for boa, mas se for ruim,
que seja: ruim mesmo é a tortura do não saber. Lembro de uma amiga que
desconfiava que o namorado iria terminar tudo – de manhã, ele tinha
anunciado uma conversa misteriosa à noite, e essa amiga, coitada, passou
o dia sem fazer nada direito. No fim da tarde, já exausta, desabafou:
“Me liga logo e termina! Não aguento mais!”
A ironia é que viver é não saber. Quer dizer, saber um punhado de
coisas, mas não saber outro punhado. Para começar, as coisas mais
básicas: por que viemos e para onde vamos. O que fazemos aqui. Se tem
algum sentido regendo essa loucura toda.
Queremos que nosso telefone toque com todas as respostas, mas só nos
resta a aflição de seguir no silêncio. São questões que talvez sejam
respondidas satisfatoriamente daqui a alguns séculos, ou talvez o mundo
acabe sem que sejam. Há, claro, os que dizem ter visões, ouvir coisas,
sentir coisas, saber das coisas. Esses têm sorte. O resto precisa se
contentar com a ignorância – ou, no auge da aflição, com respostas
enfiadas à força no lugar das perguntas. O que importa é encerrar o
mistério.
No café, volto meu olhar para o celular, e então para o jornal, mas não estou lendo mais – agora, penso em Irmãos Karamazov:
“Temos diante de nós um mistério que não podemos apreender. E, justo
por ser um mistério, tivemos o direito de pregá-lo, de ensinar ao povo
que o que importa não é a liberdade nem o amor, mas o enigma, o segredo,
o mistério diante do qual eles devem se curvar”.
Mas quem se curva ao mistério? Certamente, não os fanáticos
religiosos. Nem os céticos convictos. Nem os intolerantes de nenhuma
espécie: esses têm respostas para tudo. De modo geral, a humanidade não
se curva. Quer saber. Precisa saber. Pois como se organizar sem saber?
Como prender, soltar, ordenar, classificar, deferir, indeferir… Sem
saber?
É possível?
Naquele instante, no café, tentando bobamente resolver em mim todos
os dilemas do mundo, penso que sim, é possível. Que podemos,
independentemente da nossa fé pessoal, encontrar um sentido para a vida
na própria vida. Que as regras não precisam ter um fundamento
transcendente e tudo bem. Tomo mais um gole do meu chá e meus
pensamentos mudam de rumo: agora penso que bom seria se só as questões
metafísicas não tivessem uma resposta…
No dia a dia, entre tirar dinheiro no banco, resolver pendências e
trabalhar, a metafísica acaba mesmo sendo esquecida e vivemos como se
não fôssemos morrer. Resta-nos o mundo físico, mas esse também está
tomado pelo não saber: tomamos uma decisão hoje e não sabemos se a
consequência será a que desejamos, encerramos relacionamentos e
empregos, largamos tudo, recomeçamos tudo… Sem nunca sabermos onde vai
dar, sem nunca ter garantias. Cruzamos a próxima esquina sem saber o que
nos espera, dormimos sem saber como vamos acordar, nosso pâncreas está
funcionando perfeitamente hoje, mas e amanhã? Mesmo a mais racional das
decisões acaba sendo um tiro no escuro, como todas as outras: quem nunca
fez tudo como deveria ser feito e não deu em nada?
Viver é mesmo muito perigoso. Assustador. Exige coragem. Penso mais
uma vez na minha amiga, a que preferia uma resposta ruim ao não saber.
Mas é preferível não viver, ou não viver de verdade, a conviver
com o peso do não saber? Penso que não. Suspiro, tentando frear meus
devaneios. À minha frente, a xícara de chá quase vazia: é hora de pedir
outro. Ao lado dela, o telefone que não toca.
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